terça-feira, 16 de abril de 2019

Reflexões profundas (ou não) #36 - Aviso aos automobilistas

Senhores automobilistas que só conduzem ao domingo: hoje é terça feira.


P. S. A propósito da greve dos motoristas de matérias perigosas e da, consequente, corrida aos postos de combustíveis. E das filas. E do gasóleo esgotado. E de eu querer garantir que posso ir passear no fim de semana. Eu e todos os Portugueses, uma vez que nos encontramos na semana santa que de santa tem pouco.

segunda-feira, 1 de abril de 2019

As incoerências da maternidade... ou as minhas, que a maternidade não tem culpa nenhuma

Ele (o pai): A educadora disse-me que o "teu" filho foi apanhado a subir a uma árvore. 
(eu, que atendi o telemóvel disfarçadamente no meu local de trabalho, tive de conter a indignação por um lado e o riso por outro).

Retribui a chamada assim que consegui e quis saber pormenores.
Eu: Mas...o que aconteceu? 

Ele: Ela contou-me que foi apanhado com uns reguilas em cima de uma árvore.
(todos são reguilas, portanto)

Eu: E tu, falaste com ele? Disseste-lhe que não pode fazer isso?

Ele: Eu!? Tu aprovas e até incentivas (há muito) que ele suba escorregas ao contrário, que trepe árvores e que se empoleire. E eu vou ralhar com ele porque subiu a uma árvore?

...
...
...

Realmente, que raio de bipolaridade foi esta?

(A verdade é que temo bastante o que tenho para pagar!
P.S. Mãe, perdoa-me as dores de cabeça que te causei por causa da escola. Eu era capaz de mais, mas não sabia como o fazer.)

Claro que não me importo que trepe uma árvore, pelo contrário, quero apenas explicar-lhe que não pode subir aquela árvore porque é pequena e frágil, se todos se lembrarem de a trepar o pequeno tronco poderá ceder e partir. É só isso. Quero apenas que compreenda e respeite as regras daquele espaço, naquele contexto.

sexta-feira, 29 de março de 2019

À conversa com o meu filho # 22 - Especial Dia do Pai

- Mãe, gosto tanto de ti, vou adorar-te para sempre. Até seres velhinha. E quando morreres também...(pronunciou esta frase com uma voz trémula).

- Porque estás a falar assim, filho?

- Porque não quero que morras. Vais morrer, mãe?

- Morrerei um dia, quando for muito velhinha e quando tu fores muito velhinho.

- Prometes?

- Acredito mesmo que é isto que vai acontecer. Vou fazer tudo o que puder para que assim seja.
(Tramou-me com o "Prometes?". Eu, a pessoa que perante a sugestão de casar no dia do Batismo do miúdo, utilizou o argumento de não conseguir fazer promessas que não sabe se vai cumprir (entre outros argumentos). Coitado do Sr. Padre... Hoje compreendo a promessa que se faz no dia do casamento como uma intenção pura, intensa e sincera do momento, como uma intenção sentida e projetada no presente e no futuro, no entanto continuo com dificuldade em pronunciá-la. Não a encaro como uma verdade absoluta... pensando bem, é precisamente o contrário: encaro uma promessa como uma verdade absoluta, daí a minha dificuldade - sou tão vazia de verdades absolutas).

- Já não quero crescer, nem ficar velhinho... Já sei mãe, vou ser futebolista e construtor. Vou construir uma casa forte, com um círculo de plástico forte. Não é bem um círculo, é mais grosso... é um cilindro! Um cilindro dobrado. Uma casa especial, onde meto as pessoas "morridas". Tu não morres, vais para esta casa! O pai também. E o teu pai também. Queres, mãe?
(Filho, será essa casa, o coração?)

- Quero. Gosto tanto das coisas que tu inventas, filho. És o meu inventor preferido.

Diálogo especial no dia do Pai, 19 de Março de 2019: o dia em que o meu filho me disse que nunca morrerei; o dia em que o meu filho trouxe um bocadinho de ti até mim, pai. 

quarta-feira, 27 de março de 2019

Expetativas e defraudes... ou apenas ideias sobre maternidade

Lembro-me de não comprar um único livro sobre gravidez e parentalidade durante a gravidez. Li 2 ou 3 revistas que encontrei nas salas de espera dos consultórios de Obstetrícia. Acompanhei a gravidez semana a semana (o desenvolvimento do bebé) através de um site e através das minhas consultas e ecografias. Li algumas publicações em alguns sites. Ouvi as instruções/orientações da minha médica com muita atenção. Fiz todos todos os exames e análises. Enchi-me de vitaminas.
Pensei que seria sempre assim, que leria algumas coisas relacionadas com a maternidade esporádicas, sem demasiada informação. Acabei por sentir necessidade de comprar 3 livros já depois de o meu filho nascer, em momentos em que achei que me estava a desviar do que eu queria ser/fazer como mãe: por incapacidade, por dúvida, por cansaço ou por inexperiência, o que fosse. Procurei relatos e inspirações de amor, de decisões assertivas, de controlo, de compreensão para com o outro, de respeito. Não concordo com tudo o que está escrito e não leio os livros do início ao fim sem interrupções. Vou lendo à medida das necessidades e das vontades, vou retirando e interiorizando o que me faz falta e o conteúdo com que me identifico, vou procurando pontos comuns, identificando erros que cometo, procurando melhorar.
Não tenho por hábito ler conteúdos como se de um manual de instruções se tratassem, porque o meu miúdo é único :), e não é suposto que ninguém o conheça como eu, como o pai, como quem o ama e como quem está na vida dele e com ele diariamente. No entanto encontro-lhe características iguais às de outras crianças. Não tenho a pretensão de que a intuição me é suficiente, apesar de confiar cada vez mais nela. Procuro interpretá-la melhor. Aos meus olhos, sem fazer disso um grande drama, ainda erro muito ou controlo-me pouco. Assim, considero que ler experiências, relatos ou estudos de quem contactou com mais histórias do que eu, é uma mais valia. Respeitando-me sempre.

Lembro-me de achar que a gravidez seria um verdadeiro estado de graça e de, na prática, sentir que aquilo era tudo menos o conto de fadas com que sonhara. Superei o facto de desejar não estar grávida, porque vomitava tudo o que comia e bebia (e até o que não comia) e porque me senti muito mal durante muitos meses. Demasiados. Consegui aproveitar a minha gravidez quando parei de vomitar, consegui ser mais feliz nos 2 meses que antecederam o nascimento do meu filho, consegui recebê-lo com amor e sem mágoas por me terem roubado a gravidez idealizada.
Ainda durante a gravidez, lembro-me de enfrentar monstros que tentaram abater a felicidade de uma pessoa minha, só consegui vencê-los muito mais tarde... não há muito tempo. Pensava que nada nem ninguém conseguia abafar a luz de uma gravidez. Enganei-me.
A verdade é que o defraude das minhas expectativas acerca da maternidade começou na gravidez... não nesta, começou na minha primeira gravidez, quando recebi a notícia de que a mesma não evoluíra.

Lembro-me de pensar na pele de seda que o meu bebé teria e do cheiro que sentiria quando o encostasse ao meu peito. O meu filho teve crosta láctea, teve dermatite seborreica até às orelhas, bolsava pelo simples facto de respirar (exagero meu). A ideia da pele de seda não passou disso: tive um filho com a pele sempre carregada de óleo e de produtos com cheiros pouco apelativos, com uma "carapaça de tartaruga" no alto da cabeça. Mas beijei as suas bochechas macias milhares de vezes, tal como tinha imaginado. Ainda hoje o faço.

Lembro-me de não pensar muito nas noites. Mas confesso que nunca pensei resistir tanto - eu era das que adormecia na discoteca. E depois, não pensei que a resistência tivesse prazo de validade. Acho que terminou.

Lembro-me de querer amamentar, mas não me lembro de ser uma defensora acérrima da amamentação. E também não pensei que me custasse tanto, apesar do quadro menos cor de rosa que já me tinham pintado. Como em tudo na vida: podia correr bem, podia correr mal ou podia haver ali um intermédio - acho que foi o meu caso.

Lembro-me de querer ficar em casa com o meu filho até aos 2/3 anos. Com muita pena, aos 13 meses comecei a trabalhar a tempo inteiro.

Lembro-me de imaginar como ele seria, como seria a o primeiro sorriso, a primeira papa, o primeiro passo, a primeira ida à praia e ao parque, o primeiro dia de escola. Imaginei-o. Imaginei-me no papel de mãe dele. Mas nunca imaginei este amor; esta admiração e agradecimento por cada experiência que vivemos com ele, por cada centímetro que ele cresce e por cada centímetro que nos faz crescer. Sinto-me gigante!

Lembro-me de não pensar muito no tipo de mãe que seria, achava que só aprenderia com e na prática. Já percebi que por mais prática que tenha haverá sempre muita coisa para aprender. 

Acho que não tive expetativas em demasia, tive algumas. A gravidez foi, sem qualquer dúvida, a mais defraudada.
Há uns 2 anos julguei que podia estar grávida; era pouco provável, mas pensei que podia ter acontecido. Coincidiu com a visita de uma intoxicação alimentar e eu fartei-me de vomitar, num fim de semana que era suposto ser de passeio, não conseguia estar de pé. Lembro-me de pensar que não queria estar grávida, que não queria passar por aquilo novamente durante tantos meses, que não ia aguentar, que tinha um filho que precisava da minha atenção... Afinal não estava grávida... Fiquei triste com o teste negativo, apesar de não me sentir preparada. Continuei na dança da indecisão relativamente a uma nova gravidez durante algum tempo, sempre com medo da gravidez. Habituei-me à ideia de ter um filho.
No dia a dia da maternidade, por vezes, atropelo ideias que defendo e tenho consciência de que as adversidades ditam muitas das nossas atitudes e defraudam muitas expetativas. É mais fácil acertar quando há apoio, quando temos tempo, quando somos dois ou mais a cuidar. Quando comecei a passar mais tempo sozinha com o Rapazinho Pirata Ladrão do meu coração, comecei a perder a paciência mais vezes, a gerir mal as birras, a errar mais. A experimentar mais frequentemente a sensação de frustração por não fazer as coisas como queria.
Criei a expectativa de que os dias devem fluir naturalmente para o equilíbrio e para a plenitude. Que o som do final do dia deve ir cessando até adormecermos. Que a hora de apagar a luz do nosso lar se deve equiparar ao pôr do sol. Que os últimos passos do dia devem ser como o retorno à calma depois de uma dança ritmada. Depressa percebi que tenho de ser eu a dar o primeiro passo para que isto aconteça. Estou a aprender a descontrair quando as coisas não fluem com a tranquilidade desejada à hora (por mim) marcada.

Mais impaciência da minha parte, uma voz mais agressiva e apressada, a incapacidade de dialogar em determinadas circunstâncias e de antever conflitos pode estragar-nos o dia.
Aprendi a identificar os sintomas dos picos de cansaço (os meus e os dele), tento prevê-los e, consequentemente, evitar que ocorram. Às vezes sinto-me defraudada, mas a verdade é que já aprendi muito.

E se imaginei que ser mãe seria uma coisa maravilhosa, ser mãe deste filho superou todas as expetativas. Agradeço (muito) por isso.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

À conversa com o meu filho #21 - Achas que sou especial?

- Mãe, achas que sou especial? 

- Sim filho, acho que és especial.  

- Porquê?

- Para mim és especial porque és meu filho - os filhos são sempre especiais para os pais. Também és especial para outras pessoas: és divertido, amigo, as tuas brincadeiras são interessantes e engraçadas, és brincalhão, és criativo/és inventor, tens boas conversas...
Eu gosto muito de estar contigo. Tens um sorriso maravilhoso, sorris com os olhos; dás abraços especiais e apertados; dizes que eu sou a tua mãe preferida... Acho mesmo que és especial, e não é só por seres meu filho (isto pode ser discutível, não para mim que sou a mãe do miúdo). És especial para o pai, para os avós, para os tios, para a prima, para a madrinha...

- Hummmm, a A. (a educadora) diz que eu não sou especial; diz que o F. é que é especial. Eu não.

- Ahhhh, vamos lá falar de crianças especiais. Vamos lá ver o que é que a A. quis dizer com isso.
(Não sei como surgiu a conversa, no entanto ele interpretou assim).

(Ainda não tenho a proximidade que gostava com a educadora, mas gostava de ter comentado este diálogo com ela. Certamente terminaríamos a rir da situação, e ela ficaria a perceber a interpretação que o miúdo fez relativamente aos amigos especiais).

- Filho, o F. tem de esforçar-se muito mais do que tu para conseguir fazer determinadas coisas. Por isso é que a A. diz que ele é especial.
(Conversámos sobre as dificuldades que este menino encontra no seu dia a dia, ele foi transmitindo o que sente relativamente aos comportamentos do colega, perguntei-lhe se conseguia ajudá-lo em alguma tarefa). Relembrámos este livro e lemos "Um detetive na cadeira de rodas" da mesma coleção.

Uns dias depois:
- Mãe, o F. estava a puxar os cabelos à M.; eu perguntei-lhe se ele queria puxar os meus cabelos; ele deixou a M.; comecei a correr e ele começou a correr atrás de mim; depois cansou-se de correr atrás de mim e desistiu...

- Huuuummmmm. E como é que ele ficou?

- Ele ficou bem. E a M. também.

(Não era bem isto que eu tinha em mente quando lhe perguntei se podia ajudar o F., mas ele encontrou esta solução).

*****

- Mãe, o Menino Jesus é especial?

- Sim. O Menino Jesus foi um menino/pessoa muito especial, por isso, ainda hoje, vive no coração de muita gente.
- É especial como o F.?


*****


Mãe, a C. faz anos no dia de Natal, faz anos no mesmo dia do Menino Jesus. Ela também é especial?

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Lá vai ela a caminho dos 88

Lá vai ela tão franzina, figura frágil e dócil que esconde a ira herdada da vida, às vezes, refletida em palavras e expressões frontais sem qualquer floreado. Quando ela quer, ela consegue ser dura, apesar de doce e franzina.

Lá vai ela, a que não sabe ler nem escrever, mas que tirou o mestrado em abraços e mimos, pelo menos para pôr em prática com os netos (talvez só com os netos). É das poucas pessoas que beijo e abraço sem cerimónia. Tenho a certeza que a capacidade que tenho para beijar e abraçar o meu filho tantas vezes, se deve (muito) a ela: ao que ela me deu. 

Lá vai ela, a que guarda no rosto as marcas do caminho, as intempéries da vida, as mágoas, a desilusão e o cansaço.

Lá vai ela, a que adocicou os meus Natais com fritos finos, estaladiços e gulosos; com o bolo que herdou o nome de "bolo da avó" porque sempre foi ela que o fez; com um arroz doce que não há igual. Desiludo-me sempre que como arroz doce, nenhum é como o dela - não faço ideia se é o melhor, mas para mim é o verdadeiro.

Lá vai ela, a que nos defendia das iras da minha mãe, que se condoía com as nossas dores, que nos elogiava, mas, se necessário, nos atirava com verdades relâmpago. Talvez ela não tenha adquirido a capacidade de selecionar o que diz; talvez ela não faça nada para parecer bem ou para parecer mal. Talvez ainda guarde a pureza da sua essência, a inocência. Ela é assim e ainda bem.

Lá vai ela, a que sempre desejou conseguir juntar algum dinheiro, porque sempre teve de o contar até ao final de cada mês. Ainda assim, conseguia sempre ter uma nota de parte para nos dar no aniversário e no Natal. Eu sei que ela desejou muitas vezes ter mais dinheiro, viver melhor. Não que tivesse medo de trabalhar, mas desejava que o trabalho lhe devolvesse a possibilidade de ter uma conta a prazo, talvez porque se sentisse mais independente e segura com isso. Acho que eu e a minha irmã herdámos esta necessidade.

Lá vai ela, a que me deu uma tia-irmã. Foi mãe de uma menina aos 46 anos que é um ano mais nova do que eu.

Lá vai ela com dois bisnetos: uma menina e um menino. Como a minha irmã referiu, que pena eles não a terem como nós a tivemos.

Lá vai ela, a que me dizia desde os meus 20 anos: não demores a ter filhos, despacha-te a ser mãe, depois fico velha e não consigo ajudar-te... Fui mãe aos 37 anos e, sim, constatei que já eras velha para me ajudar. Mas lembra-te que guardo a certeza de que se tivesse sido mãe cedo, era contigo que ele tinha ficado até aos três anos de idade.

Lá vai ela, a que cozinhava para nós, a que descascava a fruta e a cortava em pedaços para termos apenas o trabalho de a saborear. Eu olhava para ela e admirava o gosto e o orgulho que ela colocava naquele ritual. Hoje, quando preparo a fruta para o meu filho, compreendo-os melhor  (o gosto e o orgulho). Simbolizam o cuidado e o mimo por quem amamos.

Lá vai ela a chegar ao fim dos 87 anos, já com menos força, menos garra, menos saúde, mais dependente. Mas com o (meu) profundo  desejo de continuar a dizer "lá vai ela", por muitos e muitos anos.

Lá vai ela, a minha avó, a caminho dos 88.