quarta-feira, 27 de abril de 2016

Grandes livros para pequenos leitores #11 - Livro do gentio e dos três sábios

Há meia dúzia de anos entrava na Livraria Bulhosa em Sete Rios e deparava-me, quase sempre, com livros infantis que captavam a minha atenção. Até parece que eram colocados estrategicamente para que eu não pudesse sair de lá sem fintá-los - acredito (mesmo) que eram. A partir daí, já se sabe, iniciava-se uma "nova relação": observava a capa e o título; folheava, com entusiasmo, as primeiras páginas tentando adivinhar o que se seguia; descobria a história e tirava as minhas conclusões. Alguns eram comprados na hora, outros ficavam-me no pensamento. Não podia comprar todos os livros com que me deparava e de que gostava, mas muitos levavam-me a pensar no que faria com eles em contexto escolar; como poderiam ser utilizados; que questões seriam levantadas se os lesse em contexto escolar. 
Sexta feira passada deparei-me com um novo livro (para mim) e, consequentemente, com uma nova Editora, que me fez sentir o mesmo, mas a uma escala mais alargada (não apenas em contexto escolar). Comecei a imaginar que este livro pode ser uma excelente ferramenta para nos ensinar a respeitar as diferenças religiosas: sem conflitos, sem competição, sem vencedores ou vencidos. Com respeito e com fé, com a fé a sobrepor-se à competição. Não faz sentido querer que uma religião seja certa e as outras erradas. Podia dizer que os conflitos a que assistimos, constantemente, em nome da religião, não servem para nada, mas a verdade é que morre gente todos os dias em nome dessa competição sem sentido. E isso tem de servir para alguma coisa, nem que seja para dar o grito de mudança; alguma coisa tem de mudar rapidamente. Mudar, seja o que for, passa também por educar ou reeducar. E a educação de hoje pode ser o melhor de amanhã. Se há expressões que são verdadeiros mantras, também há livros que o podem ser.
Esta reflexão já vai longa, por isso, aqui fica um vídeo.


O autor é Ramon Llull; é uma versão de Ignasi Moreta, com ilustrações de Àfrica Fanlo, da Editora Fragmenta.

"Era uma vez um gentio, quer dizer, um homem que não praticava nenhuma religião. Era muito sábio mas não tinha nenhum conhecimento de Deus nem acreditava que houvesse alguma coisa depois da morte. Procurando remédio para a sua tristeza, dirigiu-se a um bosque cheio de fontes e de belas árvores de fruto.
Entretanto, três sábios encontraram-se à saída de uma cidade. Um era judeu, o outro cristão e o terceiro muçulmano. Ao verem-se, cumprimentaram-se, acolheram-se mutuamente e decidiram acompanhar-se. Cada um falava aos outros dois sobre a sua crença e os seus pensamentos, e falando, falando, chegaram ao bosque por onde andava o gentio..."

... O gentio ouviu a descrição que cada um dos sábios fez acerca da respectiva religião. No final perguntou-lhes se queriam ouvir a sua decisão: qual a religião que preferia, qual a religião com que se identificava mais. Não - a resposta foi unânime. Cada um descreveu os aspetos que considerou mais importantes, no entanto não era objetivo de nenhum deles sair vencedor. A escolha era do gentio, nenhum dos sábios necessitava da validação dele para continuar o caminho que escolheu. Parece simples, não parece? Precisamos de mais sábios...
Não o comprei. Ainda. Acho que não é livro para ler ao meu filho, por enquanto; se assumir que é para oferecer à minha sobrinha, não ficarei com ele lá em casa. Tenho de encontrar outra desculpa... Ou não.
Entretanto, quero conhecer este e este e... quero conhecer todos os livros desta Editora. 

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Coisas que dão que pensar: "Eduquei os dois da mesma maneira; com um resultou, com o outro não".

"Eduquei os dois da mesma maneira: com um resultou, com o outro não". 
Trabalhei numa banca de jornais há mais de 20 anos. De vez em quando, recebia a visita de uma mãe cujo filho mais velho era toxicodependente. Ele era arrumador de carros na zona onde eu trabalhava. Uns dias, conseguia fazer o trabalho a que se propôs na perfeição, com motivação e com a assertividade que a função exige; outros, mal conseguia manter-se de pé. Por vezes, ao sábado de manhã, ajudava-me a encadernar os 557 suplementos do Jornal Expresso sem eu lhe pedir, à espera de uma moeda no final, claro. Nunca me meteu medo - nem ele, nem os outros que por lá andavam a disputar os melhores lugares e os condutores menos avarentos - nunca exigiu dinheiro. Chegou a pedir-me dinheiro, sem qualquer tom ameaçador, para comer. Eu sabia que, mesmo pagando o pequeno almoço no café em frente, estava a contribuir para a droga; desta forma, o dinheiro que receberia de seguida, em vez de ser para o pequeno almoço, seria para algo que a ele lhe fazia mais falta. Ainda assim, acho que nunca consegui negar-lhe comida.
A mãe dele, muito raramente, aparecia na banca de jornais com o filho mais novo. Este filho era bom aluno, amigo da mãe, tranquilo, sem comportamentos desviantes (seja lá o que isso quer dizer). Quando não encontrava o filho mais velho, deixava comigo comida e produtos de higiene para lhos entregar. Conversávamos um pouco e ela dizia-me quase sempre o mesmo "Eduquei os dois da mesma maneira: com um resultou, com o outro não". Há mais de 20 anos, eu tentava consolá-la, ser empática e solidária com o seu desabafo. Não tinha argumento para a constatação que ela apresentava: se ela educou os dois da mesma maneira, porque é que com um resultou e com o outro não?
Hoje dir-lhe-ia: Talvez o problema tenha sido esse; eles devem ser muito diferentes, o que resulta com um, certamente, não resulta com o outro. Como é que podiam ser educados da mesma maneira? Ou então, calava-me, porque a verdade é que só sei que (a este nível) nada sei. E uma grande teoria hoje pode tornar-se num fiasco amanhã. 

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Olá Abril de 2016

Olá Abril, como já te cumprimento tarde não tenho muito a pedir-te... mas peço-te bom tempo: dias longos, com boas temperaturas para andarmos na rua até mais tarde. Sê mais primavera daqui para a frente, combinado?

Créditos de imagem: M.O.D

Adeus meu querido mês de Março de 2016; adeus dia do pai, adeus páscoa, adeus férias

Já passou, foi em Março; estou atrasada mais uma vez.
Não escrevi nada acerca do dia do Pai, mas tenho de escrever antes de cumprimentar Abril. Este ano, o Dia do Pai foi, literalmente, do Pai. Fiquei em casa a recuperar de uma mixórdia de 3 antibióticos e por isso os meus miúdos saíram de casa antes de almoço e só regressaram à hora do lanche. Foram ao parque, almoçaram fora, passearam juntos. Divertiram-se à grande. A surpresa não foi preparada como idealizei, mas o pai recebeu a sua prenda e o dia acabou por ser totalmente dele.
Num delírio provocado, eventualmente, pelos antibióticos, lembrei-me de não me lembrar de nenhum dia do Pai com o meu pai. Nem de realizar os famosos presentes na escola. Nada de nada. De certeza que os fiz, julgo que os dei a outra pessoa, mas não me recordo. A isto deve chamar-se memória seletiva...
Fomos ao Jardim Zoológico: uma parte de mim queria ir; outra não. Lembro-me de ir lá muitas vezes com o meu pai em criança, de ele ser muito alto e eu muito baixa para acompanhar as suas longas passadas, lembro-me da moeda e do elefante, dos macacos e dos leões, dos passeios. Está tudo muito diferente e eu também. O rapazinho adorou e nós, à conta dele, também. Andámos de comboio, no teleférico, vimos os golfinhos, visitámos a quintinha, demos uma ou duas voltas ao recinto. Foi cansativo, mas divertimo-nos. Fomos os três e a afilhada do pai; a prima não estava cá.
O Domingo de Páscoa traduziu-se num almoço normal: nós os três e a minha mãe. Sentimos a ausência da tia e da prima.
5 dias úteis de férias: dois dias e meio de limpezas e exames médicos; dois dias e meio de exclusivo com o Índio do meu coração.
Constato, mais uma vez, que sou desprovida de algumas tradições: nunca fiz a caça aos ovos de Páscoa. Calendário do Advento e Caça aos ovos, me aguardem. No entanto, demonstrando alguma incoerência, comecei a celebrar a passagem de semestre o ano passado - uma tradição inventada.
Adeus meu querido mês de Março e até para o ano.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

A brincar é que a gente (pequena) se entende #8 - Sexta-feira

Não, não foi hoje. Foi a semana passada, no dia 1 de Abril, que nós os quatro (eu, a minha irmã, o meu filho e a minha sobrinha) fomos aproveitar a tarde solarenga, com temperaturas elevadas, num jardim novo (para nós). 
Levámos lanche, bolas, baldes, pás e trotinetes. O jardim é grande, tem um lago grande, tem uma esplanada, tem patos, tem baloiços e muita gente (por acaso, na fotografia ali em baixo não aparece ninguém, mas estava cheio). Eles correram, treparam, empurraram, jogaram à bola, emprestaram brinquedos, caíram, choraram, levantaram-se e continuaram a brincar. A bola dele rebolou, rebolou e caiu dentro do lago. Um alvoroço entre as crianças que assistiram à cena; algumas (eu incluída) a passar para a outra margem do lago e a esperar que o vento levasse a bola até lá; foi ela que a resgatou, com a minha ajuda; enquanto ele, no colo da tia, lamentava a sua (eventual) perda. Todas as tardes de sexta feira podiam ser assim. O fim de semana é muito maior quando começa à sexta feira à tarde. Gosto disto.

Imagem retirada da internet.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Grandes livros para pequenos leitores #10 - Para ele: O Cuquedo; Para ela: Este Alce é Meu.

Os presentes desta Páscoa (que já passou há alguns dias):
Para ele, com 2 anos e meio, escolhi o livro "O Cuquedo";
Para ela, com 5 anos e meio, o livro "Este Alce é Meu". 

O livro "O Cuquedo" foi um excelente presente para quem foi ao Jardim Zoológico uns dias antes. Não foi propositado, mas calhou muito bem. É divertido, acho que tem de ser lido com convicção e entoação, com muita expressividade, com pedidos de colaboração por parte do pequeno leitor - depois de o ler tantas vezes, já peço ao Índio para completar algumas das frases da narrativa; ele próprio já papagueia excertos da narrativa mesmo quando não o estamos a ler. A narrativa repetitiva, apenas com alteração/adição de personagens, é assimilada facilmente pelos mais pequenos (e pelos grandes :)).
Quem é o Cuquedo? Os animais da Selva, apesar de andarem num alvoroço por causa dele, não sabem quem é.
À medida que fomos descobrindo o livro, fomos relembrando a visita ao Jardim Zoológico (foi o nosso passeio de Páscoa), o andar no comboio, o andar no teleférico, os golfinhos, os leões, a girafa, o pai a dar ervas à Girafa e como ela se baixou para a comer, etc. etc.
É um livro de Clara Cunha, com ilustração de Paulo Galindro, da Editora "Livros Horizonte".



"Este Alce é Meu", conta a história de um rapaz que assume que o Alce que lhe apareceu é seu. Tenta educá-lo, tenta adaptá-lo ao seu quotidiano e às suas vontades, tenta que ele viva de acordo com as suas regras, mas será que o Alce é mesmo seu? Apenas seu? Este livro fala dessa estranha pretensão de que podemos ser donos de alguém. Será que o Alce é mesmo do Guilherme? 
As ilustrações são maravilhosas; a mensagem é uma lição. É um livro de Oliver Jeffers, da Editora Orfeu Negro, coleção Orfeu Mini.