segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Quero Ver (ou já vi): Helen Keller e o milagre Anne Sullivan

Há uma semana consegui um par de horas de "folga". Com algum barulho de fundo (as reclamações do miúdo), mas livre das habituais tarefas (banho, jantar, deitar) e com poucas interrupções. O sofá e o comando foram meus durante aquele tempo. O pai comandou o barco - vou reivindicar mais folgas como esta.
Procurei o documentário "o começo da vida" no youtube, enganei-me e coloquei na pesquisa "o milagre da vida". Nas 1001 opções listadas, apareceu-me este filme: 


O nome Helen Keller soava-me familiar, a imagem captou a minha atenção e acabei por pressionar o play quase involuntariamente. O filme começou e eu não o larguei mais, foi um daqueles encontros felizes e inesperados que nos prendem ao ecrã. O filme é forte, é complexo, é emotivo, é bonito. É intenso. É tanta coisa e ainda consegue ser uma lição.
É baseado na história verídica de Helen Keller que ficou cega, surda e muda antes dos dois anos de idade. Retrata o período da sua vida em que os pais, desesperados pela incapacidade que sentem em relação à sua educação e perante o comportamento agressivo da filha, procuram ajuda externa numa professora, que também ela foi cega. E aqui começa a montanha russa de sensações, emoções e questões.
Os pais que permitem que a filha faça tudo devido à sua condição. Os pais que sentem pena da filha. Os pais que não conseguem, sozinhos, estabelecer comunicação de forma eficaz com a filha. Os pais que premeiam com doces o comportamento agressivo da filha. Os pais que amam a filha.
Uma professora que chega decidida em pôr a pequena a comunicar, nem que para isso tenha de enfrentar e desafiar os pais, pondo em causa o seu desempenho. Que lhes pede/exige para ficar sozinha com a criança de 6/7 anos, sem permitir sequer visitas. Que questiona os seus métodos ou a ausência deles. Que me parece focada/obcecada num objetivo. Que põe em causa muitas correntes pedagógicas/ideias educacionais que tanto defendemos hoje. Uma professora que ama aquela criança.
Dou por mim a assentir o comportamento da professora no momento em que a criança lhe bate e ela retribui da mesma maneira; logo eu que tento excluir a palmada da educação que dou ao meu filho; logo eu que até repito a frase mais do que feita "comportamento gera comportamento". Dou por mim a não julgar a professora quando esta condiciona a proximidade entre filha e pais (ela considera que eles são um travão ao seu desenvolvimento); logo eu que defendo tanto que a escola e a família devem ter uma relação de proximidade. Tudo aquilo me parecia um tratamento de choque, com o qual eu discordo, no entanto os resultados surgem e a empatia com a professora aumenta. No final, fico com a certeza de que aquela professora amou muito Helen: acompanhou-a até ao fim dos seus dias. Não me parece que falar de métodos pedagógicos seja o mais importante quando se vê este filme, no imediato não pensei nisso, mas mais tarde sim, confrontei o que defendo com o que vi, consciente das adversidades da situação e do contexto.
É um filme de emoções fortes, que nos arranca lágrimas com muita facilidade, mexe connosco, põe em causa as nossas (as minhas, neste caso) convicções e espelha a capacidade que podemos ter para amar o próximo. Educar não será tarefa fácil para ninguém, mas só alguns conseguirão educar em determinados contextos. Claro que os tempos são outros, sabem-se mais coisas (às vezes), existem outros apoios (para alguns), a tecnologia evoluiu bastante, mas em jeito de conclusão só me ocorre pensar que todas as crianças (com ou sem deficiências; com ou sem dificuldades, financeiras incluídas; com ou sem limitações) deviam experimentar uma dedicação (por parte de educadores e professores) semelhante. E não, não estou a escrever que não existe, estou apenas a escrever que nem todos têm a possibilidade de experimentar isto. Nem todos necessitarão de uma dedicação igual à que Helen necessitou, mas todos necessitam de alguma.
Conheço um jovem que não pode frequentar a escola devido a uma doença oncológica; a escola em que ele está matriculado ainda não encontrou uma solução para ele fazer este ano letivo; estamos prestes a terminar o 1.º período; isto nos dias de hoje em que conseguimos, em tempo real, saber se está a chover no outro lado do mundo. Uma adolescente, com problemas cognitivos diagnosticados, tem apenas 1 hora de terapia da fala por semana. Um bebé de 19 meses que removeu um tumor parcialmente e que não vê; não conheço esta mãe, mas quando se fala da sua história tenho sempre vontade de a abraçar; sei que ela precisa de muito mais do que o meu abraço. Aposto que há professores  e técnicos no desemprego (e no ativo) capazes de se dedicarem a estes tipos de casos... Mas já sei, é tudo mais complexo do que estas simples e insignificantes palavras proferidas por quem não percebe nada do sistema, por quem não compreende a complexidade de pôr em prática a Intervenção Precoce em pleno, por quem não entende as equipas multidisciplinares. Sou uma básica, também já sei, não consigo alcançar tanta complexidade. Voltando ao filme, vale muito a pena.

Helen Keller pareceu-me familiar devido ao Centro Helen Keller: "a primeira escola portuguesa a integrar alunos com deficiência visual, fortemente ligada à evolução da Educação Especial no nosso país".

2 comentários:

  1. Deixaste-me com muita vontade de ver o filme e eu ando com tanta falta tempo.

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  2. Como eu compreendo a falta de tempo, mas vale a pena. Fica a dica para quando for possível. Confesso que o tema cegueira me é sensível, principalmente porque soube há dias que um bebé de 19 meses, que vive perto da minha casa, não vê; e porque já trabalhei com uma pessoa que não vê. No entanto, acho que ninguém fica indiferente a esta história.
    Bjs

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