domingo, 26 de julho de 2015

Avós: Os meus e os teus.

Quando nasci os meus quatro avós ainda eram vivos. Tinha ainda uma bisavó materna. Lembro-me de ter orgulho em dizer que tinha quatro avós e uma bisavó. Era normal ter 4 avós, mas lembro-me de muitas amigos já terem perdido algum, de um lado ou de outro. Eu achava que tinha a maior riqueza do mundo porque tinha os quatro mais o bónus da bisavó. Tive maior proximidade com os avós maternos porque os meus pais separaram-se quando eu tinha 2/3 anos, mas tenho recordações boas dos avós paternos. Na verdade, as melhores recordações são as das duas avós, ambas divorciadas por motivo de desrespeito e de maus-tratos.
A minha avó materna foi mãe substituta, aquela que fazia a nossa comida preferida, aquela que corria para fazer um doce quando lhe dizíamos ao telefone que íamos visitá-la, aquela que nos cortava a fruta porque, coitadinhas de nós, nos podíamos cortar, aquela que zelava pelo nosso bem estar, aquela que nos dava colo e que estava sempre do nosso lado. Ainda hoje é assim. Ela viveu na nossa casa durante alguns anos e o instinto protetor, os mimos que nos dava a título gratuito sem pedir nada em troca são património da nossa formação moral e a melhor herança que podemos ter. Lembro-me de querer ficar com ela por me sentir livre, por me sentir criança de verdade, sem responsabilidades, livre de pressões.
A minha avó paterna era alta, muito alta para a época em que nasceu, tanto, que os sapatos eram feitos por encomenda. Era delicada. Tinha um olhar verde transparente, tão transparente que quase lhe líamos o pensamento através do olhar. Tinha uma beleza fora do normal e calhou-lhe um destino traiçoeiro. Eu gostava muito dela e sentia no seu olhar e no seu sorriso sincero e puro que ela também gostava de mim. Ela não esteve mais presente na minha vida porque o meu pai ausentou-se da minha vida por alguns períodos de tempo, ou eu ausentei-me da dele, não sei. Ela não esteve mais presente na minha vida porque não me conseguia alcançar, eu vivia longe e ela não podia caminhar na minha direção. Viveu muitos anos numa cadeira de rodas e dependente de todos. Tenho saudades dela, foi uma referência para mim. Lembro-me de as pessoas dizerem que me parecia com ela, mas não. Ela era tão mais bonita, tão mais singela e delicada do que eu. Dela, não herdei o mesmo cuidado e proteção que herdei da minha avó materna, mas herdei o amor e o carinho que me tinha.
Do meu avô materno, recordo-me que vendia gelados em mercados, que me oferecia um gelado de vez em quando, que, até uma certa idade, nos levava ao mercado na época de Natal e no aniversário para nos comprar roupa nova. Não me lembro de valores, mas lembro-me de traços da sua personalidade que eu não queria ter. Ele tratou mal a minha avó e eu tomava as dores dela como minhas.
Do meu avô paterno, lembro-me de o ir visitar à terra, da casinha modesta que tinha e de o ver andar de carroça puxada por um burro. Acho que a minha avó se apaixonou por ele quando o viu montado num cavalo branco. Ouvi esta história, mas não sei descrever bem como foi. A verdade é que, no final desta história que podia ter um final feliz, não foi amigo nem companheiro da minha avó.

Filho, infelizmente, já não tens avô materno. Mas tens duas bisavós. Desejo que construas boas recordações dos teus avós, tenho lutado por isso apesar de todas as dificuldades. Não tem sido fácil, aliás, é cada vez mais difícil.
Desejo que os teus avós te transmitam valores, que marquem a tua personalidade com mimos e risos, que te amem. Que te amem muito, mas que não minem a família nuclear que somos nós os três. Não permito maldades, não permito deturpações da realidade, não permito intrigas gratuitas, não permito obsessões, não permito falsas moralidades. Se for para te amarem, que te amem, sem interesses e sem cobranças. Porque o amor de verdade é assim, mas há pessoas que não o sabem.
Espero que descubras através dos teus avós, familiares e amigos o verdadeiro valor do amor simples e despretensioso. No fim de tudo isto, é o que importa. Desejo que construas boas memórias de vivências com os teus avós e que eles permitam que as guardes no coração. E que um dia, tal como eu, decidas em consciência quais são as tuas melhores recordações. É bom ter avós!

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